INTRODUÇÃO
Memória da Cana conta a história de uma família cheia de conflitos e relações incestuosas. Jonas é o patriarca da família, e mantém uma paixão obscura por sua filha Glória, que também o vê com admiração. Senhorinha, a mãe, presencia momentos muito fortes em sua própria casa, onde Rute, sua irmã, para satisfazer o desejo de seu cunhado, leva jovens meninas para serem desvirginadas. Guilherme é apaixonado pela irmã Glória. Edmundo, expulso de casa pelo pai, abandona a mulher, por uma paixão velada pela mãe.
Memória da Cana descreve o nordeste pesado de uma família cheia de mágoa e solidão.
Memória da Cana – A Peça
A peça começa no corredor da sala do teatro III, como se tentasse conectar o espectador com a obra antes que ele entre de fato no teatro. Ao entrar estamos literalmente dentro da casa que separa os cômodos por telas. No centro uma grande mesa de jantar, no entorno os quartos de cada membro da família, que também servem de platéia.
Cada quarto tem as peculiaridades de cada personagem, os seus objetos e cheiros. A Idéia é transportar o público para a realidade desse lugar.
A mesma tela que separa os cômodos também circunda o espaço todo, inserindo os espectadores nesta casa de engenho, mas deixando-os assistir a tudo através do filtro que esta tela produz, oferecendo ora uma visão nítida, ora uma visão embaçada, dependendo do ângulo de visão de cada um. Nenhum espectador vê a peça exatamente do mesmo jeito. O lugar do espectador, sua cadeira, também é o da individualidade.
A mesa de jantar é o lugar de expor as diferenças, é lá que todos os conflitos e enfrentamentos acontecem, a mesa aproxima e aparta. Santos são dispostos sobre ela, tentando minimizar o peso de tanto pecado.
A iluminação é parte do espetáculo, nos envolve e nos aproxima ainda mais do tempo e espaço cênico. Uma luz azulada nos diz que está chovendo, focos de luz indicam de quem é a cena, velas são dispostas sobre a casa e quando o cenário se modifica a vela é a única iluminação de todo o cenário.
O vento proposto é forte e movimenta o canavial, ambos nos transportam ainda mais pra realidade daquele ambiente.
O sotaque é bastante carregado e nos situa regionalmente. Os atores parecem estar em sintonia com a visão do diretor, porém, são extremamente melodramáticos, o que nem sempre é bom (não para mim). A peça gira em torno de excessos, nos aromas que por vezes enjoam, no som da percussão que é ao vivo e progressivamente se torna mais alto e irritante, além dos atores que gritam demasiadamente. Talvez seja essa a intenção do diretor, de fato, mas infelizmente não é algo em que o espectador se adapte com facilidade.
A troca de cenário no meio do espetáculo é sensacional, as telas que são retiradas, a mesa que é desmontada pelos próprios atores, o chão da casa que vira terra preta batida. Cria-se um novo ambiente sem que o espectador se mova.
O fato de, particularmente, não gostar desse ritmo cênico e de tantos exageros, não me faz pensar em uma nova forma de fazê-lo. A peça pede esse ritmo, essa força, essa intensidade. É um espetáculo pesado, carregado de problemas familiares muitos ruins, e nós, espectadores, como um ponto positivo, entramos e vivemos essa história junto com eles, porém, a princípio, foi difícil descrever o que sentir com relação à peça.
Memória da Cana não é um espetáculo mediano, é muito improvável que alguém goste, mais ou menos, da peça. Ou se ama, ou se odeia.
Por: Tatiana Sousa